“Descobri que para muitas pessoas existe um grande abismo entre o que esperam de sua fé cristã e o que de fato acontece. A partir de um verdadeiro mundo de livros, sermões e testemunhos, todos prometendo vitória e sucesso, elas aprendem a esperar que Deus atue de modo impressionante em suas vidas. Se não enxergam tais intervenções, sentem-se desapontadas, traídas e frequentemente culpadas.”
“Sei que alguns cristãos rejeitariam sem mais nem menos a expressão “decepção com Deus”. Tal ideia é inteiramente errada, dizem. Jesus prometeu que a fé do tamanho de uma semente de mostarda é capaz de transportar montanhas, que qualquer coisa pode acontecer se dois ou três se reunirem para orar. A vida cristã é uma vida de vitória e triunfo. Deus quer que sejamos felizes e prósperos e que tenhamos saúde; qualquer outra condição revela falta de fé.
Foi durante uma visita a pessoas que creem exatamente assim que finalmente tomei a decisão de escrever este livro.”
“Essas perguntas quanto à justiça, o silêncio e o ocultamento de Deus tinham se tornado minhas também, e deram partida à minha busca através da Bíblia. Quando comecei aquela busca, queira um Deus mais ativo, um Deus que ocasionalmente arregaçasse as mangas e interviesse em minha vida com visível poder. No mínimo, pensei, eu desejava um Deus que não permanecesse tão oculto e calado. Certamente isso não era pedir demais.”
“Encontrei-me com pessoas que usavam expressões do tipo “falei com Deus” e “o Senhor me disse.” Algumas vezes eu também falava daquela maneira. (...) Será que o Senhor de fato me disse alguma coisa? Nunca ouvi uma voz nem tive qualquer prova acerca de Deus, que eu pudesse ver ou tocar. Ainda assim, eu ansiava por aquele tipo de intimidade.”
“Talvez eu estivesse apenas aprendido a imitar os outros. Comecei a imaginar se não estava vivendo às custas das experiências de outras pessoas.”
“Algumas pessoas têm grande saudade dos “velhos bons tempos” do Antigo Testamento, quando Deus usou uma estratégia mais óbvia e visível. O Antigo Testamento fala de um encontro de verdade assinado por Deus, em que garante segurança e prosperidade físicas, sob certas condições; o Novo Testamento não oferece um contrato assim. A mudança da presença visível de Deus no deserto para a presença invisível do Espírito Santo envolve igualmente um certo tipo de perda. Perdemos a prova clara e certa de que Deus existe. Hoje em dia, Deus não paira sobre nós numa nuvem que podemos fitar quando buscamos renovar nossa confiança. Para alguns, como Richard, essa parece de fato uma grande perda.”
“Êxodo descrevia o próprio mundo que Richard almejava! Mostrava Deus entrando quase que diariamente na história humana. Mostrava-o agindo com absoluta justiça e falando de tal forma que todos podiam ouvir. E mais do que isso: ele até mesmo se fez visível”
“Continuei lendo, vasculhando os livros de Josué e Juízes para ver os resultados dessa aliança baseada num sistema “justo” de retribuição e punição. Num prazo de cinqüenta anos, os israelitas tinham-se desintegrado, passando a um estado de anarquia total. Grande parte do restante do Antigo Testamento relata a história deprimente das maldições (não as bênçãos) preditas que se tornaram verdade. Apesar de todos os abundantes benefícios da aliança, Israel deixou de obedecer a Deus e, assim, cumprir as condições estipuladas.
A orientação clara de Deus aos israelitas parece não estimular o desenvolvimento espiritual. Na realidade, isso quase eliminou por completo a necessidade de fé. Esvaziou a liberdade, tornando cada escolha uma questão de obediência, e não de fé. E nos quarenta anos de peregrinação pelo deserto, os israelitas foram tão mal no teste da obediência que Deus se viu obrigado a começar de novo com uma nova geração.
Anos mais tarde, quando os autores do Novo Testamento olharam para aquela história passada, não apresentaram a aliança como um exemplo em que Deus se relacionava com absoluta coerência e justiça com o seu povo. Ao invés disso, disseram, a antiga aliança servia como uma lição objetiva: demonstrava que os seres humanos eram incapazes de cumprir um contrato com Deus. A eles parecia claro que fazia-se necessária uma nova aliança (um “novo testamento”) com Deus, uma aliança baseada no perdão e na graça.”
“A presença visível de Deus nada fez em termos de aperfeiçoar uma fé duradoura.”
“Deus forneceu sinais em abundância aos israelitas, e a fé deles simplesmente se tornou preguiçosa – não mais tinham de crer.”
“Os israelitas são uma grande demonstração de que os sinais só conseguem nos tornar viciados em sinais, não em Deus.”
“Assim como Deus achou quase impossível viver entre um povo pecaminoso, os israelitas acharam quase impossível viver com um Deus santo no meio deles. Se você mal consegue suportar a luz de vela, como conseguirá olhar para o Sol? “Quem dentre nós habitará com o fogo devorador?”, indagou o profeta Isaías. Será possível que, em vez de estarmos frustrados, deveremos estar gratos por Deus estar escondido?”
(Em Salomão, vemos que...) “O sucesso do reino deste mundo havia provocado um desinteresse no Reino de Deus.”
“Os sinais e maravilhas dos dias de Elias (como aqueles ocorridos no Monte Carmelo) foram um instante isolado na história, sem qualquer efeito real de longo alcance sobre os israelitas. Não irrompeu qualquer reavivamento avassalador.”
DA DELEGAÇÃO:
“Não sabeis que sois santuário de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós?”, escreveu Paulo aos indisciplinados de Corinto. Para os judeus, é claro, o templo era um edifício de verdade, o local central na Terra onde habitava a presença de Deus. Será que Paulo estava afirmando que Deus havia se mudado?
Na Bíblia aparecem três templos e, reunidos, ilustram uma seqüência: Deus se revelou primeiramente como Pai, então como Filho, e finalmente como Espírito Santo. O primeiro tempo foi uma estrutura magnífica construída por Salomão e reconstruída por Herodes. O segundo foi o “templo” do corpo de Jesus (“Destruí este santuário” , disse, “e em três dias o reconstruirei”). E agora tomou forma um terceiro templo, construído a partir de seres humanos.”
“Num ato de delegação quase inconcebível, Jesus transferiu o Reino de Deus a pessoas como seus discípulos – e para nós.”
“Deus assumiu esse risco, e, porque o fez, o mundo o conhecerá basicamente através de cristãos. A doutrina do Espírito Santo é a doutrina da Igreja: Deus vivendo em nós. Tal plano é a “loucura de Deus”, como diz Paulo numa passagem, e o escritor Frederick Buechner se maravilha diante da “loucura”: “Escolher para seu santo trabalho no mundo... mentes aleijadas e desajustados e intransigentes e santinhos e pedantes e excêntricos e egomaníacos e acanhados e libertinos disfarçados.” “Porque a loucura de Deus”, prossegue Paulo, “é mais sábia do que os homens.”
“Mas na era do Espírito, Deus delega sua reputação, até mesmo sua essência, para nós. Nós encarnamos Deus no mundo; o que acontece conosco acontece com Ele. Deus faz sua obra através de nós. “Sem Deus, não conseguimos. Sem nós, Deus não fará”, disse Agostinho.”
“Se você quer ver a Deus, então olhe para as pessoas que pertencem a ele – elas são o seu Corpo. São o Corpo de Cristo. “
“Uma grande parte da decepção com Deus tem raízes na desilusão com outros cristãos.”
“A romancista cristã Dorothy Sayers disse que Deus submeteu-se a três grandes humilhações em seus esforços por resgatar a raça humana. A primeira foi a Encarnação, quando vestiu as limitações de um corpo físico. A segunda foi a Cruz, quando sofreu a ignomínia da execução pública. A terceira humilhação, Sayers sugere, é a Igreja. Num impressionante ato de autonegação, Deus confiou sua reputação a pessoas comuns.”
“A última Voz é tão próxima quanto um sopro, tão suave quanto um cochicho. É a mais vulnerável de todas as Vozes, e a mais fácil de se ignorar. A Bíblia diz que se pode “apagar” ou “entristecer” o Espírito (tente apagar a sarça ardente que falou a Moisés ou as rochas derretidas no Sinai!) Entretanto, o Espírito também é a Voz mais íntima e pessoal. Em nossos momentos de fraqueza, quando não sabemos o que devemos orar, o Espírito que vive dentro de nós intercede em nosso favor com gemidos que palavras são incapazes de expressar.
O Espírito não irá retirar toda frustração que sentimos para com Deus. Os próprios títulos dados ao Espírito – Intercessor, Ajudador, Conselheiro, Consolador – presumem que existirão problemas.”
E a Bíblia mostra um claro avanço nos esforços divinos em chegar até os seres humanos sem vir a constrangê-los: desde Deus Pai, que pairava paternalmente sobre os hebreus; passando pelo Deus Filho, que ensinou a vontade de Deus “de baixo para cima”, ao invés de fazê-lo de cima para baixo; e finalmente até o Espírito Santo, que nos enche com a presença literal de Deus. Nós que vivemos agora não estamos em desvantagem, mas somos maravilhosamente privilegiados, pois Deus escolheu depender basicamente de nós para executar sua vontade na Terra.”
SOFRIMENTO E O MUNDO ESPIRITUAL:
“Deus não está sendo julgado no livro de Jó. É Jó que está em julgamento. O temo do Livro não é o sofrimento: onde Deus está na hora da dor? O prólogo tratou dessa questão. O tema é a fé: onde Jó está na hora da dor?”
“Será que uma pessoa consegue crer, sem desespero, mesmo quando Deus lhe parece um inimigo? Ou será que a fé é apenas mais um produto do ambiente, da cultura e das circunstâncias?”
“Queremos crer que as mil e uma escolhas fáceis e difíceis que fazemos diariamente têm, de alguma forma, um valor. E o Livro de Jó insiste que elas têm; a fé de alguém pode fazer a diferença.”
“Aprendi a não confundir Deus com a vida. Eu me sinto livre para amaldiçoar a injustiça da vida e para dar vazão a toda minha tristeza e ira. Não o culpo (Deus) pelo que aconteceu.”
(Em Jó vemos que...) “sua fé deixou de ser uma “fé contratual” – “Seguirei a Deus se ele me tratar bem” – para ser um relacionamento que podia transcender qualquer dificuldade.”
“Ninguém está isento da tragédia ou da desilusão – o próprio Deus não esteve isento. Jesus não ofereceu qualquer imunidade, nem qualquer caminho para escapar da injustiça, mas, em vez disso, um caminho para atravessá-la até chegar do outro lado.”
“Deus, por que estás me tratando de modo tão injusto?”, Jó choramingou o livro inteiro. “Põe-te no meu lugar.” “NÃO!!!”, Deus troveja em resposta. “Ponha-se você em meu lugar!”
“Para tais pessoas, presas no presente, decepcionadas com Deus, a Bíblia oferece dois tratamentos: lembrar do passado e considerar o futuro.”
“Fé: você nunca culpa a Deus pelas coisas ruins, mas ao mesmo tempo lhe dá crédito pelas coisas boas!”
“E também podemos experimentar “períodos de neblina”, quando Deus permanece calado, quando nada funciona de acordo com o convencionado e todas as promessas da Bíblia parecem ostensivamente falsas. A fidelidade significa aprender a crer que, fora do perímetro de névoa cinzenta, Deus ainda reina e não nos abandonou, não importam as circunstâncias.”
“Num certo sentido, a natureza humana precisa mais de problemas do que de soluções.”
(Observe como...) “Geralmente, muitas respostas impressionantes a orações vêm no início, antes da conversão, ou logo após.”
“Se fôssemos mais fortes, talvez fôssemos tratados com menos ternura. Se fôssemos mais corajosos, talvez fôssemos enviados, com bem menos ajuda, para defender posições bem mais críticas na grande batalha.”
“Quando Deus parece ausente, pode estar mais perto do que nunca.”
“Deus está calado? Respondo a essa pergunta com uma outra: A Igreja está calada? Nós somos seus porta-vozes, as cordas vocais que ele designou neste planeta.”
“Os porquês são perguntas válidas, não sintomas de uma fé fraca – são, na realidade, tão válidas que Deus tomou providências para que a Bíblia incluísse todas elas.”
“Como Jó, podemos aprender que, do “outro lado”, está acontecendo muito mais do que talvez suspeitamos. No mundo natural, os seres humanos só recebem cerca de 30% do espectro da luz.”
“Se você não consegue compreender o mundo visível em que você vive, como tem a ousadia de esperar compreender um mundo que nem pode ver?”
“Algo bem mais importante do que a felicidade esteve em jogo aqui.”
Máximas:
“Seus discípulos têm de parecer mais salvos para que eu creia em seu Salvador.” Friedrich Nietzsche
“A perseverança não é apenas a capacidade de suportar uma coisa difícil, mas de torná-la em glória.” William Barclay
“Crer que o sobrenatural é, aqui e agora, a maior das realidades.” T.S. Eliot
“Onde já não há qualquer oportunidade de dúvida, também já não há qualquer oportunidade de fé.” Paul Tournier
“Não se esqueça nas trevas do que aprendeu na luz.” (Livro de Jó)